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Sonhar é preciso, nem que for sonho de padaria...

Nem uma coisa nem outra, o que há entre elas é o que me encanta

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Fazenda Baraúna

Na sala onde eu nasci, tudo é motivo de festa
Não há carros, nem internet, ninguém conhece o mar
A água daqui é salobra e todos dão graça a Deus.
Igreja aqui quase não há, a luz elétrica ainda não chegou

Dormimos todos com as galinhas e acordamos antes do dia
Dia de parto é um rebuliço só e haja garrafa!
Dia de extrema unção todo mundo ri e chora junto
E bebe e come e reza e põe a vela na mão do finado
E o velório acaba em festa e os anjos dizem amém...

Na sala onde eu cresci, ninguém sabe o que é sala
Mas todo mundo espera a noitinha pra contar histórias na varanda
Primeiro o pai, depois a mãe e bem depois os meninos
Lavam os pés sem saber o que se gasta mais,
Se as solas ou os cacos de telhas e sabugos
A varanda acesa, o milho assando, o lava-pés,
A vida em brasa, a noite aqui, chega assim

Na mesma bacia a água é uma só, a dor é só uma
e os sonhos se perdem nas chamas da fogueira,
misturam-se entre os descanso dos pés e a latência cardíaca que não cessa
Sem querer, aqui se vive com pressa.
Não se sabe se de vida ou de ante vida,
Ninguém aqui toca no nome da morte...

Perdida entre as vadiagens e os sorriso falhos,
No meio do agreste, no sopro do vento quente,
Perambula aqui a poesia rude e leve
Os meninos armam arapucas pra pegar o passarinho cor de laranja que
Tem nome de “sofrê”.
No fundo eles têm inveja do bichinho, só por vontade de voar...
Têm uns que até comem o probrezinho, só por vontade de voar...

Latência, dormência...
Embaixo da farinheira, sentada no chão,
A mãe cruza as pernas, raspa a mandioca
e amamenta a criança.
A menina, de uns olhozinhos tão pequenos aprende atenta o ofício de viver
Enquanto a tarde caminha serena e lenta...

Todo mundo sorri igual aqui,
E o aroma da raiz santa cria a ilusão de um forno assando
E ninguém passa fome...

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